Desde março que o crítico de cinema Wilson Baltazar, 76, colunista do O POVO, está afastado da sua maior paixão. Um infarto deixou-lhe longe (por pouco tempo, garante) das idas rotineiras ao cinema. Ia de duas a três vezes na semana e tinha dias em que ficava para ver de três sessões seguidas. Fosse o que fosse, ele assistia: comédia, terror, drama... Bastava estrear. “Para mim, cinema não tem pátria, foi bom, eu apoio”, diz. Mas a fala se contradiz logo em seguida, quando se toca na palavra preferência. “Os filmes europeus são os meus prediletos, são os mais difíceis”, assume.
Mas não é qualquer europeu que faz a sua cabeça. Seu Baltazar encontra-os mais especificamente nas chamadas sessões de arte. Só que elas têm sido cada vez mais raras e os horários, cada vez menos acessíveis para quem já não está podendo passear tanto assim. “O cinema de arte está perdendo o prestígio. Os horários são restritos e difíceis. Aos domingos, tem sessão que começa às 22 horas. Isso é hora de estar voltando para casa?”, protesta. “Cada vez que se abre um shopping, o cinema que não é comercial, o cinema de arte cai um degrau”, aponta. Verdade.
Ao mesmo tempo em que apontam para o crescimento de apreciadores do cinema de arte, números da empresa de pesquisa Filme B e da Agência Nacional de Cinema (Ancine) mostram que as salas voltadas para este tipo de filme não acompanham o crescimento daquelas destinadas às produções comerciais. Enquanto o público saltou de 89,1 milhões de espectadores em 2007 para 143,8 milhões em 2011, no mesmo período, o número de salas que representava 7,8% do total de espaços de exibição caiu para 6,8%.
Em Fortaleza, os espaços reservados para o cinema de arte são irrisórios. Até abril deste ano, além de uma ou duas sessões do complexo Multiplex (Iguatemi), a capital contava com duas salas do cinema do Centro Dragão do Mar destinadas às produções ditas não comerciais. Com o fim do patrocínio do Banco Itaú ao espaço, a garantia da nova gestão era de que o foco continuaria nos filmes de arte, mas também abriria espaço para às películas mais comerciais para dar opção aos “jovens”. Dito e feito. Hoje, os filmes de arte rotineiramente dividem as salas do Dragão com grandes lançamentos, como o brasileiro “E aí, comeu?”, uma versão brasileira de blockbuster que atualmente está em cartaz no local.
“O mercado de arte vem diminuindo porque hoje o filme só funciona se tiver uma referência, um diretor reconhecido, tiver ganho prêmio em Cannes e se tiver uma boa comunicação”, explica Elias Oliveira, gerente de programação da distribuidora Imovision. A empresa, aliás, foi uma das vítimas recentes do jogo de forças desmedido exercido pelas distribuidoras detentoras de direitos autorais de grandes lançamentos mundiais.
O longa da qual é detentora dos direitos, o documentário em 3D Pina, dirigido por Wim Wenders, ainda estava lotando as salas de cinema quando teve que ceder espaço para a entrada de Os Vingadores. Ele estava na quarta semana de exibição e levando uma média de 1.500 espectadores às salas de cinema nos finais de semana, mas teve que fechar seu público em 100 mil pessoas.
“A gente tem uma linha de produtos diferenciada, trabalha com filmes premiados, tem uma abertura mais consistente nas salas de exibição, mas ainda sinto uma dificuldade de programar porque você tem um número de salas e todas elas ocupadas por grandes filmes”, conta Elias Oliveira. “Mesmo tendo ganhado vários prêmios em diferentes festivais, você tem sempre ter um argumento além dos que ele já tem sozinho. Mas público sempre tem, depende da forma como o filme é divulgado. Toda cidade tem um mercado para cinema independente ”, completa.
Alternativa
Sem o acesso às salas comerciais, os filmes independentes e de arte acabam descobrindo novos rumos e também atraindo aqueles que buscam alternativas para a massificação do cinema. Além dos circuitos de festivais e exibições pela Internet, os filmes independentes estão ganhando cada vez mais espaço nos cineclubes. Em Fortaleza, há pelo menos 40 projetos do tipo funcionando em diferentes bairros e equipamentos culturais da cidade.
Integrante do cineclube Subvercine e representante do Ceará do Conselho Nacional de Cineclubes, Djaci José conta que a ideia de criar espaços de exibição alternativos tem crescido na cidade e espalhado o propósito original dos cineclubes que é a formação de novos públicos. “É uma saída para quem está cansado do circuito comercial, mas a gente sabe que a internet permite muito acesso. O cineclube é interessante porque você está assistindo junto com outras pessoas e tem a possibilidade de discutir uma ideia. Para produtores independentes de curtas e longas, é uma alternativa porque foge das distribuidoras, mas tem o lado de não dar lucro”, aponta Djaci. (Naara Vale)
Fonte: http://www.opovo.com.br/app/opovo/vidaearte/2012/06/23/noticiasjornalvidaearte,2863942/mais-salas-menos-filmes.shtml
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